É sabido que a gente se acostuma a não amar, mas não deveria.
A gente se acostuma a deixar de amar um irmão porque nos traiu,
A gente se acostuma a não amar um namorado(a) que se foi,
E porque nos traiu ou nos deixou a gente se acostuma que é possível superar amores fortes como tais.
E por achar que superou a gente se acostuma a não amar outras pessoas,
E por não amar a gente se acostuma a ficar sozinho,
E por ficar sozinho a gente acaba se esquecendo que não nascemos para ficar só.
Esquecemos o afago,
As caricias,
Os desejos,
E a própria solidão de ser só.
A gente se acostuma com os beijos trocados na balada e se contenta com tão pouco,
A não dividir o seu dia com alguém porque se sente confortado,
A estudar e conquistar a independência mesmo sabendo que isso é pura ilusão,
A passar os finais de semana sozinhos trancados dentro do quarto com os filmes que escolheu,
Com a pipoca de microondas,
Com o refrigerante sem gás,
A não se envolver com o vizinho que te acha bonito(a) porque tem medo que ele também te deixe,
A deixar sua vida passar sem ter dividido ela com alguém.
A gente se acostuma a passar horas a fio para dizer não ao colega que te chamou para o teatro,
A não sorrir para quem está disposto a te conquistar,
A não ver quando tudo que o outro(a) queria era que o visse.
A gente se acostuma a dizer não para o amor,
E acaba se acostumando com migalhas que caem das mesas dos que vivem com intensidade esse sentimento.
E se acostuma em acreditar que isso não existe,
A gente se acostuma demais com o medo de sofrer,
E acaba afastando um amor aqui e outro ali.
Se alguém toma iniciativa e te diz o que está sentindo,
Ainda assim você insisti em dizer não por ser mais fácil e por estar tão acostumado em se afastar.
Se afasta e padece do coração que está tão só.
E volta para o seu quarto escuro,
E liga o seu computar para ver um romance de cinema.
E se o filme te faz chorar e se emocionar a gente se consola por não ter um grande amor.
E por não ter esse amor a gente se acostuma em dormir depois do filme,
Chorando no travesseiro a espera de um príncipe encantado,
E se acostuma em sonhar apenas com sapos,
A gente se acostuma com a aspereza do nosso coração,
Com a preservação dos nossos sentimentos,
A gente se acostuma para evitar cicatrizes, magoas, traumas, rancor.
Se acostuma para poupar o peito.
A gente se acostuma em deixar passar a vida, a nossa vida, que se vai pelos nossos dedos.
E de tão gasta já não tem alguém para amar.
E se perde no meio do caminho de tanto se acostumar com nada.
Texto A gente se acostuma a não amar,
De Diógenes Ramos (Didikayan)